terça-feira

Agronegócio, agrotóxico e “agrocâncer”.


As consequências desse modelo, que se tornou hegemônico nos últimos dez anos, já apresentam resultados perversos para o meio ambiente, para a economia e para a saúde dos brasileiros.
As três palavras acima não são mera propaganda. Nos últimos dez anos tomou conta da forma de produzir na agricultura brasileira, o chamado agronegócio. Ele é um modelo de produção de mercadorias agrícolas, subordinado agora aos interesses do capital financeiro e das grandes empresas transnacionais. Aliados aos fazendeiros brasileiros, que entram com a natureza.
Nesse modelo, o capital financeiro entra com o capital. Do valor bruto de produção agrícola ao redor de 160 bilhões de reais, os bancos entram com aproximadamente 110 bilhões todos os anos, financiando a compra dos insumos e cobrando os juros, sua parte na mais-valia agrícola. E as empresas transnacionais fornecem os insumos agrícolas, máquinas, fertilizantes químicos e, sobretudo, os venenos agrícolas. A produção agrícola depois se destina ao mercado mundial, as chamadas commodities agrícolas.
Esse modelo construiu então uma forma de produzir, uma matriz tecnológica que combina grande propriedade, que vai aumentando a escala de produção a cada ano, monocultivo, se especializando num só produto de exportação, mecanização intensiva, pouco emprego de mão-de-obra direta e uso intensivo de venenos agrícolas. As conseqüências desse modelo que se tornou hegemônico nos últimos dez anos, e que atua independente de tudo, já apresentam seus resultados perversos, para o meio ambiente, para a economia brasileira, para o rendimento econômico dos próprios fazendeiros e, sobretudo para a saúde dos brasileiros.
Em termos econômicos, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), esse padrão de exploração econômica levou a uma matriz básica de custo de produção, em que os fazendeiros capitalistas brasileiros gastam em média, 24% com fertilizantes químicos, quase todos importados, 15% de todo capital investido em venenos, e mais 6% em sementes transgênicas. Pagam em média 2% de royalties para as empresas de sementes, totalizando 47% de todo seu custo. E gastam apenas 4% com mão-de-obra de trabalhadores rurais brasileiros e ficam, no final, com 13% de lucro. Ou seja, a conta é clara. Nossa agricultura está totalmente subordinada aos interesses do capital financeiro e estrangeiro e transfere a eles a maior parte do valor de produção.
Os resultados no meio ambiente são catastróficos. Hoje 80% de todas as terras cultivadas são utilizadas no monocultivo da soja/milho, cana de açúcar, algodão e na pecuária extensiva. Isso tem gerado um desequilíbrio da biodiversidade na natureza, que se agrava com aplicação dos venenos agrícolas, que matam tudo.
Com essa destruição da biodiversidade pelo monocultivo e pela aplicação dos venenos se gera um desequilíbrio também no regime das chuvas e nas condições climáticas de todo território brasileiro. Essa é a razão fundamental da ocorrência mais freqüente de secas mais duras e de enchentes mais torrenciais em todas as regiões do país.
Também se percebe as conseqüências na saúde humana e animal. O Brasil se transformou no maior consumidor mundial de venenos agrícolas. Consumimos sozinhos 20% de todos os venenos do mundo. As dez maiores empresas mundiais produtoras de venenos, que começaram na primeira e segunda guerra mundial produzindo bombas químicas, agora produzem venenos. São elas: Sygenta, Bayer, Basf, Dow, Monsanto, Dupont, Makhteshim (de Israel) Nufarm (Austrália) e Sumimoto e FMC (Japão). São todas empresas transnacionais que controlam os venenos no mundo e aqui no Brasil. Os fazendeiros gastaram 7,3 bilhões de dólares comprando venenos nessas empresas.
Os venenos, por serem de origem química, não se degradam na natureza. Eles matam os insetos, as bactérias no solo, afetam a fertilidade, contaminam as águas subterrâneas, contaminam as chuvas - muitos desses venenos secantes evaporam e ficam na atmosfera e depois retornam com as chuvas. E contaminam os alimentos que as pessoas consomem.
No organismo das pessoas estes venenos geram todo tipo de distúrbio, vão se acumulando, afetam órgãos específicos, até produzirem câncer com a destruição das células.
Isso e muito mais foi agora denunciado por um extenso e profundo relatório produzido pela Associação Brasileira de Pós Graduação em Saúde Coletiva (Abrasco). O documento alerta para os riscos e conseqüências que o uso generalizado de venenos agrícolas está provocando na saúde dos brasileiros.

Animais viviam melhor que trabalhadores em fazenda-zoológico no Maranhão


Em Santa Inês (MA), fazendeiro mantinha pequeno zoológico com bichos bem tratados, e criação de gado com 12 empregados em situação análoga à de escravo; processo trabalhista pode chegar a R$3 milhões.
Guilherme Zocchio

Vitória é uma zebra rara: vive entre pessoas e tem acesso livre à casa do seu dono, o fazendeiro Francisco Gil Alencar. Ele é proprietário de um minizoológico em Santa Inês (MA) cujo nome lhe presta uma homenagem: o "Gilrassic Park". Além de Vitória, o parque conta com 900 outros bichos de 100 espécies diferentes, principalmente aves e animais silvestres, que recebem acompanhamento especializado de um zootecnista.
   
Trabalhador mostra recipiente com água que
ele e colegas eram obrigados a beber - Fotos: MTE
   
A pouco mis de cinco quilômetros do Gilrassic Park, na mesma propriedade, a situação de 12 empregados de Francisco Gil era bem distinta: eles foram resgatados de condições análogas às de escravo pelo grupo móvel de fiscalização, em inspeção no fim de março deste ano. A vistoria contou ainda com membros do Ministério Público do Trabalho (MPT) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Os libertados trabalhavam sem carteira assinada ou equipamentos de proteção individual (EPIs), fazendo o roçado manual do pasto dos bois da Fazenda Coronel Gil Alencar, onde fica o Gilrassic Park, em condições absolutamente subumanas e degradantes.

Segundo a fiscalização**, o alojamento dos trabalhadores ficava no meio do mato, em espaço geograficamente isolado e sem meio de transporte disponível. Para chegar ao grupo de 12 escravos, a equipe percorreu uma longa trilha a pé a partir do quilômetro 30 da rodovia BR-222, através de um matagal e de uma estrada alagada. Eles vasculharam um extenso terreno de pastagem por cerca de duas horas até encontrar o barraco onde estavam os empregados, nas margens de um igarapé.
Os trabalhadores dormiam no mesmo terreno da pastagem dos bois. O alojamento tinha somente a cobertura de uma lona preta e alguns maços de palha, sem paredes laterais ou qualquer tipo de proteção contra animais peçonhentos, chuva e outras intempéries. Ainda não havia nas redondezas lugar adequado para as necessidades fisiológicas de um ser humano.

segunda-feira

Estudo aponta crescimento da pobreza com avanço do agronegócio em SP


Por Gerson Freitas Jr. 
Do Valor Econômico

O crescimento do agronegócio, frequentemente associado ao aumento da renda e à prosperidade no interior do país, também pode ter relação com o avanço da chamada pobreza relativa (a incapacidade de se viver de acordo com o custo de vida local) e da violência no campo.

É o que sugere um estudo divulgado ontem pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Presidente Prudente e financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que criou um conjunto de 50 mapas intitulado "São Paulo Agrário".

De acordo com a pesquisa, cidades paulistas que experimentaram uma forte expansão da atividade agrícola entre 1990 e 2008 observaram também um aumento da pobreza relativa e o acirramento dos conflitos agrários no período.

O trabalho, que cruzou informações sobre concentração de renda, pobreza relativa, produção agrícola, uso da terra e mortes por conflitos no campo, demonstra que o fenômeno foi particularmente evidente nas regiões Oeste e o Nordeste do Estado, onde o aquecimento da atividade agrícola foi acompanhado do aumento da violência e da marginalização econômica.

"Isso reitera o fato de que esse modo de produção leva aos municípios uma prosperidade concentrada nas mãos de poucos, enquanto gera um número cada vez maior de excluídos", conclui o autor da pesquisa, o geógrafo Tiago Avanço Cubas.

Segundo ele, Ribeirão Preto, um dos principais polos do agronegócio no país, é um caso típico da relação entre prosperidade agrícola e pobreza. "O município viveu de 1990 a 2008 um crescimento desordenado impulsionado pelo investimento rural e que levou ao surgimento e intensificação do número de moradias precárias". Segundo dados do IBGE, citados pelo estudo, Ribeirão Preto possui 26 favelas, quase todas originadas nos últimos 20 anos.

O trabalho sustenta ainda que os pequenos produtores, responsáveis pela maior parte da produção de alimentos como feijão e mandioca, enfrentam grandes dificuldades e dependem de ações assistencialistas para sobreviver. "São necessárias políticas emancipatórias para o setor", conclui Cubas.