Meninos
e meninas têm as mãos queimadas por ácido e perdem as digitais dos
dedos no processo de quebra da castanha de caju. Mesmo após denúncias, o
problema persiste no Rio Grande do Norte.
Passado um primeiro
momento de grande arrancada na prevenção e eliminação do trabalho
infantil no Brasil, do início dos anos 1990 a meados dos anos 2000, o
país enfrenta um novo desafio para manter o ritmo de queda. Enquanto a
primeira fase foi marcada pela retirada de crianças e adolescentes das
cadeias formais de trabalho, o novo desafio são as piores formas de
exploração, como o processamento da castanha, que o poder público tem
mais dificuldade de erradicar. O trabalho informal e precário atinge
especialmente os adolescentes e jovens e está relacionado à evasão
escolar e à falta de alternativas oferecidas pelo mercado. A erradicação
requer um plano com ações, metas e indicadores. E uma ação política
coordenada.
Muitos leitores ficam irritados quando conectamos
trabalho infantil ou escravo ao nosso consumo, o que significa nos
inserir como parte beneficiária da cadeia de escoamento. Pois não
deveriam. Não é culpa que se busca com a transparência da origem dos
produtos que consumimos, mas essa informação é fundamental para
pressionar governos e empresas a adotarem políticas a fim de garantir
que isso não aconteça. Afinal de contas, a ignorância é um lugar
quentinho.
A reportagem é de Daniel Santini, da Repórter Brasil,
que foi a João Camara, no Rio Grande do Norte, verificar as condições
das crianças que perdem as digitais no processamento da castanha:
Olhe
a ponta do seu dedo. Repare no conjunto minúsculo de linhas que formam
sua identidade. Essa combinação é única, um padrão só seu, que não se
repete. As crianças que trabalham na quebra da castanha do caju em João
Câmara, no interior do Rio Grande do Norte, não têm digitais. A pele das
mãos é fininha e a ponta dos dedos, que costumam segurar as castanhas a
serem quebradas, é lisa, sem as ranhuras que ficam marcadas a tinta nos
documentos de identidade.
O óleo presente na casca da castanha de
caju é ácido. Mais conhecido como LCC (Líquido da Castanha de Caju),
esse líquido melado que gruda na pele e é difícil de tirar tem em sua
composição ácido anacárdico, que corrói a pele, provoca irritações e
queimaduras químicas. No vilarejo Amarelão, na zona rural de João
Câmara, as castanhas são torradas – além de corroer a pele, o óleo é
inflamável – e quebradas em um sistema de produção que envolve famílias
inteiras, incluindo as crianças.
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