Maria Melo
De Brasília
Trabalhadores são obrigados a passar as noites isolados, privados do convívio social e familiar, sem estrutura de alojamento e alimentação adequada
A exploração de trabalhadores no Norte do país já não é privilégio apenas de empresas privadas e latifundiários. No início de janeiro, o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário (Sinpaf) denunciou a existência de pessoas em condições degradantes de trabalho no Campo Experimental do Distrito Agropecuário da Suframa, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Amazônia Ocidental, localizado em Presidente Figueiredo (AM).
Distantes cerca de 50 quilômetros da cidade onde vivem, Manaus, os trabalhadores são obrigados a passar as noites entre segunda e sexta-feiras isolados no campo, privados do convívio social e familiar, sem estrutura de alojamento e alimentação adequada, atendimento médico ou acesso a telefone.
A situação veio à tona quando a presidenta da Seção Sindical Amazônia, Simone Alves, começou a apurar um caso de desentendimento entre empregados ocorrido fora do expediente de trabalho, que gerou a suspensão irregular de um deles. “Descobrimos que eles são obrigados a passar as noites lá para que a empresa não gaste com transporte. Além disso, são usados para vigiar o campo experimental – o que caracteriza desvio de função. Não ganham hora de sobreaviso nem hora extra”. Segundo a sindicalista, eles também são obrigados a cozinhar a própria comida e a se alimentar em um refeitório improvisado em meio a fezes de morcegos e ratos espalhadas pelo chão e paredes, sem qualquer condição de higiene. O lugar onde dorme o trabalhador José Maria, conhecido por Fumaça, é na verdade um miniauditório abandonado. Nenhum alojamento do campo possui mobília nem cama, tampouco fornecimento de lençóis ou de colchões.
Jornada exaustiva
A jornada de trabalho no local também é exaustiva: apenas oito trabalhadores da Embrapa e dois terceirizados cuidam de toda a área, que tem cerca de cinde mil hectares e dezenas de experimentos em andamento, envolvendo plantas e animais. “É preciso caminhar por cerca de três horas na mata carregando equipamentos e insumos para chegar aos locais dos experimentos em determinadas épocas no ano”, conta a diretora de Saúde do Trabalhador e Meio Ambiente do Sinpaf, Mirane Costa.
Em desacordo com o Acordo Coletivo de Trabalho da empresa, que estabelece o direito de ir e vir do local de trabalho diariamente após o início e fim da jornada, não há transporte para os operários do campo. “Mas o supervisor da área tem carro da Embrapa com deslocamento diário até sua residência em Manaus”, destaca a diretora.
De acordo com a dirigente, a supressão do direito ao convívio social e familiar diário também é vista como contribuinte aos casos de degradação do ambiente de trabalho, brigas e intrigas internas e ao alto índice de dependentes alcoólicos no grupo. “Dos oito trabalhadores, identificamos pelo menos três com essa dependência, associada por diversos estudiosos da relação de trabalho como doença promovida pela degradação das condições laborais. Há relatos de estresse e esgotamento mental, inclusive com denúncias já formuladas junto ao Ministério Público Federal e com atestado médico – neste caso para o Campo Experimental do rio Urubu, também pertencente à Embrapa em Manaus e gerido em condições semelhantes”.
Como não há serviço de vigilância, os funcionários são forçados a fazê-lo de forma involuntária, sem qualquer preparo para defender suas vidas e o patrimônio da Embrapa – que os imputa informalmente a responsabilidade pelo serviço.
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