sexta-feira

Venenos da terra à mesa

Produtos químicos altamente danosos à saúde estão sendo aplicados em grandes quantidades até nas lavouras de agricultura familiar em Pernambuco. Sem saber, muitas pessoas consomem alimentos contaminados que podem causar problemas graves no sistema nervoso e na regulação hormonal, além de dores de cabeça, depressão, câncer e má-formação embrionária. Além disso, os solos encharcados de veneno logo estão imprestáveis para o cultivo.

Produtos como endosulfan, acefato e metamidofós, banidos em mais de trinta países, são livremente comercializados no Brasil. Cerca de dez produtos proscritos na União Europeia (UE), nos Estados Unidos, na China e até no Paraguai ganham saída em nossas lavouras. São gastos todo ano no País cerca de US$ 6 bilhões com agrotóxicos, o que nos faz o maior consumidor mundial de tais substâncias. Para se ter uma ideia da dimensão desse mercado, a mais nova fábrica de defensores agrícolas, que está sendo inaugurada em Uberaba (MG), irá produzir 100 milhões de litros de defensivos agrícolas anualmente. O tamanho do mercado nacional acarreta pressões políticas no Congresso, contra as proibições e pela liberação de produtos sem vez no mercado internacional. O lóbi dos ruralistas não para de atuar em defesa dos agrotóxicos, que seriam responsáveis pela força do agronegócio brasileiro.

De fato, os defensivos agrícolas são como remédios usados para combater pragas e doenças nas plantações, conferindo segurança ao agronegócio e garantindo o abastecimento alimentar das cidades. Mas esses remédios precisam ter estrito controle do poder público, justamente porque são aplicados em larga escala, e seus efeitos colaterais podem atingir milhares de pessoas. Como demonstrou a reportagem do JC no último dia 22, a venda e o uso de agrotóxicos são práticas comuns no interior do Estado. Em Vitória de Santo Antão, pedaços de terra de até dois hectares, a poucos metros da BR-232, têm plantações de alface, coentro e cebolinha cheias de veneno. Os pequenos agricultores de Natuba têm noção do risco que correm, mas desconsideram o risco que passam para os outros. Embalagens com resíduos das substâncias são descartadas em locais próximos da lavagem de alfaces colhidas que são encaminhadas para a venda. O descumprimento das regras é a regra na agricultura de pequeno porte no Estado. A Agência Pernambucana de Vigilância Sanitária (Apevisa), encontrou, em 2009, a presença dos três agrotóxicos citados em diversos produtos, como pimentão, repolho, alface e tomate, oriundos de Vitória de Santo Antão, Gravatá, Agrestina, Sairé, São Joaquim do Monte, Petrolândia, Salgueiro, Iguaraci e Camocim de São Félix. Mas de um terço dos hortifrútis examinados pela Vigilância Sanitária estavam contaminados em concentrações de risco para a saúde dos consumidores.

O problema é sério e atinge outros Estados do Nordeste. No Ceará, como relatou edição recente da revista Carta Capital, o aquífero Jandaíra está ameaçado, e a água de poços artesianos e das torneiras apresenta índices de contaminação, de acordo com pesquisa feita pela Universidade Federal do Ceará na Chapada do Apodi. Segundo a médica e professora Raquel Rigotto, coordenadora do estudo, dos 7 milhões de casos de intoxicação e das 70 mil mortes que ocorrem no mundo todo ano em decorrência do uso de defensores agrícolas, a maior parte se dá nos países em desenvolvimento, onde a legislação e a fiscalização são mais frouxas.

A Agência de Defesa e Fiscalização Agropecuária (Adagro) garante que os produtos comercializados nos supermercados e nas feiras orgânicas são de procedência segura. A desinformação dos pequenos agricultores, aliada à deficiência de assistência técnica e à dificuldade de fiscalização, no entanto, compõem um quadro preocupante. Quadro que se torna mais sombrio diante do prazo estipulado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que decidiu tirar o endosulfan do mercado brasileiro – somente em julho de 2013. É de se questionar por que uma substância banida em 45 nações ainda tenha três anos de sobrevida entre nós. 

Fonte: Site da ASA 

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